Eu casada e eu solteira são duas pessoas distintas que, não apresente elas, por favor, que elas não vão se dar. Eu já disse isso, que tenho muito trabalho com meu ego que tento sempre manter no lugar, sabendo que ninguém é melhor do que o outro mas, eu sempre me achei melhor do que a minha vizinha. Que agora não é mais minha vizinha. Que tem uma vida igual a de todo o resto do mundo e eu morro de medo disso. Ela acha maravilhoso. A minha vizinha que tem os braços e a barriga flácidos e que não sabe beber sem dar vexame. Que ficava em casa toda noite assistindo novela e comendo cachorro quente com um marido normal perfeitamente encontrável em qualquer esquina por aí, depois de um trabalho normal, e a discussão sobre o plano de saúde familiar e o seguro do carro enquanto eu ia pra academia malhar a minha bunda pra ficar dura.
Eu que sempre detestei homens com cantadas baratas e mais ainda, homens com cantadas maravilhosas que te colocam num pedestal e te fazem sentir foderástica, eu não sei o que eu não suportava mais. Eu deveria gostar de ser cortejada, conquistada não apenas por um mas por alguns rapazes bonitos ao mesmo tempo brigando num eterno leilão de quem dá mais. Sentar no meu trono de rainha e me esbaldar dos manjares de loucuras que eles faziam....ah...eu deveria gostar muito disso. Eles que vinham com esse jeitinho de vida hermeticamente arrumada, equilibrada e respeitada por qualquer ser humano normal, que chega aos poucos, natural, amoroso, perfeito, belo, doce e carinhoso. Mas não. Eu me sentia castigada. Eu não conseguia simplesmente aceitar esse amor que se oferece por ai, em caixas com laços coloridos pronto pra entrega, que qualquer outro poderia ter. Que todo mundo já conhece. Enquanto isso, eu gostava de moços que chegavam voando numa moto, com cavanhaque bem aparado e tatuagens coloridas e expressivas. Que olhavam a minha foto na internet e vinham parar na minha cidade pra ver se era isso mesmo de verdade. Que não mandavam mensagem o dia todo enchendo a minha caixa com coisas repetitivas, chatas e clichês. Que demoravam pra ligar, mas que ligavam.
Que não diziam que estavam com saudade assim que dobravam a esquina. Moços que faziam mistério pelos corredores da empresa me olhando de canto de olho (verde) e sorriso encantador e deixando um rastro de perfume onde passavam, deixando um rastro de esperança na minha cara. Que me seguiam na saída e convidavam pra um chopp, noutro dia, quem sabe. Que olhavam nos meus olhos e viam quem de verdade vive aqui dentro. Eu, de carne, de pedra. Doida de pedra. Ansiolítica, inquieta, sinônimo de insônia e dor de cabeça. Que não faziam de mim um medíocre ser especial. Me libertando dessa repetição maldita de todos os casos. ''Especial'' como qualquer um. Eu só queria um moço que chegasse me revirando, me carregando, me arrebatando. Com sorriso bonito, humor afrodisíaco e passado zerado. Que desse um pouco de trabalho, que não contasse história, que fosse direto ao ponto. G . Por favor! Que não me deixasse arrependida de ter saído de casa ainda no meio do caminho. Que me fizesse rir sendo espontâneo e contando bobagens inteligentes. Que conseguisse ser mais engraçado e sarcástico do que eu.
Então eu me sentia profundamente ofendida quando me ofereciam esse tipo de amor, igual a tudo que já existe à minha volta. Que não consegue me alcançar. Que era pouco demais pro que eu precisava. Igual a minha vizinha, absurdamente igual a todo mundo.
Eu sigo achando a minha grama infinitamente mais verde do que a dela. Com meu umbigo perfeitinho. Até dá gosto. E defeitos por defeitos, ocupo-me dos meus. Que são meus. Divertida pros amigos e leal quando se trata de amor. Despida, egocêntricamente eu . Amar a si mesma, não é ser egoísta. E dane-se. Dá certo, sempre deu. O amor de verdade apareceu. Chegou me libertando desse tédio. Graças a Deus.